quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Duração da gravidez depende da placenta


Período de gestação é diferente nas espécies. Ligação do feto à mãe é chave.

O tempo de gestação difere muito entre as espécies de mamíferos. Nove meses nos humanos, seis no babuíno, três no leopardo, três semanas no rato, e por aí fora. Qual é o motivo para tamanhas disparidades? Este mistério com cem anos acaba de ser resolvido. A resposta está na complexidade da estrutura da placenta.

Uma equipa de investigadores das universidades britânicas de Durham e Reading estudou 109 espécies de mamíferos e descobriu que, apesar de também existirem outros factores envolvi- dos nesta questão, como a dimensão dos indivíduos das diferentes espécies - quanto maiores são, maior é a tendência para gestações mais longas -, a chave está na estrutura da placenta que liga a mãe ao feto. Quanto mais complexa é a forma da placenta, menos tempo de gestação é necessário para o desenvolvimento dos filhos. A descoberta foi publicada ontem na revista científica American Naturalist.

A investigação, que foi coordenada por Isabella Capellini, da Universidade de Durham, mostrou que em alguns mamíferos o ritmo de crescimento dos embriões e fetos na gravidez chega a ser duas vezes superior ao de outros, e que esta maior rapidez está directamente ligada à complexidade da placenta e também à maior ou menor ligação, através destes tecidos, entre a mãe e o filho. As coisas funcionam assim: quanto mais complexa é a estrutura, e quanto mais ligações existem entre a placenta e o novo ser, mais rápido é o período de gestação.

É exactamente isso que acontece em animais como os leopardos ou os cães. A placenta que se forma nestas espécies é extremamente complexa e a ligação entre ela e os tecidos do feto estabelece--se através de uma densa rede de conexões, como não se observa, por exemplo, nos seres humanos.

"Nos seres humanos, a placenta tem uma ramificação simples como se fossem dedos, e as conexões entre os tecidos da mãe e os do feto são limitadas", explica Isabella Capellini. E sublinha que nos leopardos, por exemplo, essa rede de ligações é muita densa, "criando uma área de transferência de nutrientes muito maior", e permitindo assim um ritmo mais rápido de crescimento do feto.

O estudo mostra, assim, que a ligação entre mãe e feto é muito mais complexa do apenas a da troca sanguínea, que até agora era olhada como a chave do problema.

|Filomena Naves, DN

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Nasceu a primeira forma de vida artificial


Uma bactéria, comandada por uma molécula de ADN sintético, conseguiu reproduzir-se da forma mais natural. O resultado, publicado na revista Science, tem aplicações e implicações – científicas e filosóficas – ainda em grande parte desconhecidas.


Na fotografia, as colónias de células, com uns 70 micrómetros de diâmetro, parecem diminutos ovos estrelados com a gema azul. Graças a isso, sabemos que não estamos a olhar para uns microrganismos quaisquer, mas para as bactérias criadas por cientistas no laboratório. Vida artificial, fabricada de raiz num pratinho de vidro, a partir dos seus componentes genéticos elementares.

A nova bactéria foi feita “a partir de quatro frascos de compostos químicos”, gosta de repetir Craig Venter nas entrevistas que tem concedido à imprensa (sob embargo) nos últimos dias. Com os seus colegas, o conhecido “caça-genes” norte-americano acaba de inaugurar oficialmente a “era da biologia sintética”. Cada um desses quatro “frascos”, entenda-se, contém uma das "letras" do "alfabeto" com que se escreve o ADN – A, T, G, C –, as moléculas de base que compõem esse grande livro da vida genético.

A equipa do J. Craig Venter Institute, EUA, já tinha anunciado várias vezes o que vinha aí. Mas na realidade, a sua saga, que começou há mais de 15 anos e custou 40 milhões de dólares, foi pautada, sobretudo desde 2007, por episódios muito excitantes – e também por obstáculos que fizeram os autores temer o fracasso. “Demorou muito mais tempo do que poderíamos ter imaginado”, salienta Venter.

Mas já está – e o nascimento desta primeira forma de vida artificial ficará registado para a posteridade nas páginas da edição de sexta-feira da revista Science (e na Web, desde hoje). “Esta é a primeira célula sintética jamais fabricada”, afirma Venter, “e dizemos que é sintética porque a célula é totalmente derivada de um cromossoma sintético.”

Peças de lego

Em 2007, a equipa mostrou que era possível transplantar o genoma de bactérias de uma espécie para bactérias de outra espécie semelhante e fazer com que a segunda mudasse de espécie, adquirindo a da primeira – isto é, trocasse a sua própria identidade pela do seu novo ADN. No ano seguinte, conseguiram sintetizar na íntegra o genoma de uma bactéria.

Bastava agora, para criar um ser vivo artificial, combinar as duas coisas. Assim obter-se-ia uma bactéria cujo ADN fora retirado e substituído por um ADN diferente – e desta vez, completamente fabricado pelos cientistas. Esperava-se que esta bactéria se comportasse como um ser vivo natural, usando o ADN sintético como património genético para se reproduzir.

Uma primeira dificuldade técnica foi simplesmente o facto de não existir tecnologia que permita construir moléculas do tamanho do ADN, composto pelo encadeamento de centenas de milhares de pares de bases A, T, G, C. Ora, o ADN da bactéria utilizada nas experiências, Mycoplasma mycoides, contém mais de um milhão de pares de bases.

Os cientistas começaram por comprar a uma empresa especializada os cerca de 1000 bocadinhos, cada um com uns 1000 pares de bases, que constituem esse ADN bacteriano. Recorda Venter: “Foi como ter uma caixa de peças de lego e ter de as montar.”

Introduziram as peças dentro de leveduras (uma máquina natural de desfiar ADN) e obtiveram peças mais extensas; a seguir, introduziram-nas dentro de bactérias Escherichia coli e sintetizaram cadeias ainda maiores – antes de as voltarem a pôr dentro de leveduras. No fim, tinham um genoma inteiro de Mycoplasma mycoides, totalmente fabricado no laboratório.

Contudo, o ADN sintético era um pouco diferente do ADN natural de Mycoplasma mycoides, porque entretanto os cientistas tinham eliminado 14 genes potencialmente patogénicos (para as cabras) e acrescentado várias “marcas de água” – sequências de letras do ADN facilmente reconhecíveis como artificiais: um sítio de Internet, os nomes dos elementos da equipa e várias citações famosas, “para dar um toque mais filósofico à coisa”, frisa Venter.

Um bug microscópico

Mas o mais difícil foi fazer com que o novo ADN funcionasse dentro das células hospedeiras – e de facto, da primeira vez que os cientistas introduziram, esperançados, o genoma sintético nas células da bactéria Mycoplasma capricolum... nada aconteceu. Tal e qual especialistas de software, a equipa andou durante três meses a fazer debugging do código do ADN, explica um artigo jornalístico que acompanha a publicação na Science. Finalmente descobriram, há cerca de um mês, que o que estava a empatar tudo era um erro numa única letra do código! Os ovos estrelados com gema azul começaram a proliferar.Nem toda a gente concorda em dizer que a nova bactéria é totalmente sintética, uma vez que foi preciso introduzir o ADN artificial dentro de uma célula viva já existente. Mas isso não impede os especialistas ouvidos pela Science de saudarem os resultados. Venter, quanto a ele, não tem dúvidas de que a bactéria seja totalmente sintética: “Após algumas replicações, não resta absolutamente nada de M. capricolum nas novas células”, argumenta. Novas células que produzem unicamente – e da forma mais natural do mundo – proteínas específicas de M. mycoides.

Por enquanto, o processo não é eficiente. Mas as aplicações futuras podem ser coisas como a criação de algas produtoras de petróleo (Venter já tem um “grande contrato” com a Exxon) ou que reduzem “em 99 por cento” o tempo de fabrico das vacinas contra a gripe sazonal (em colaboração com a Novartis).
20.05.2010
|Ana Gerschenfeld, Público

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

A história da consciência como nunca a tínhamos ouvido contar


Há dez anos, em O Sentimento de Si, o neurologista português António Damásio explicava pela primeira vez a sua visão de como o cérebro humano constrói a consciência. Agora, em O Livro da Consciência, volta ao mesmo tema, mas com uma "receita" muito mais apurada e onde mistura ingredientes que até aqui tinham ficado esquecidos nas gavetas das neurociências. Com a vibrante prosa que o caracteriza e o profundo enraizamento das suas ideias na arquitectura e nas aflições cerebrais, conta-nos a emergência da consciência no cérebro humano como nunca a tínhamos ouvido contar.

"Fa franziu o sobrolho e olhou para a sua barriga, levou a mão direita à cabeça e disse: 'tenho uma imagem'. Abandonou a escarpa e apontou para o bosque e o mar: 'estou ao pé do mar e tenho uma imagem. É uma imagem de uma imagem. Estou - disse, levantando a cara e franzindo o sobrolho - a pensar."

William Golding (mais conhecido como o autor d'O Senhor das Moscas) escreveu estas linhas em Os Herdeiros (The Inheritors, 1955), um romance onde imagina o encontro, há dezenas de milhares de anos, de duas espécies de seres humanos. Uma mais evoluída (nós?), os "cara de osso", imberbes, erguidos, magros, com rituais e ferramentas mais complexos; a outra mais primitiva (os Neandertais?), peluda, robusta e ágil a trepar às árvores.

Uma das características mais salientes da estranha e maravilhosa narrativa de Golding é o número de vezes que recorre à palavra "imagem". Os Neandertais estão constantemente a "ter" imagens e a declarar que têm imagens (que portanto lhes pertencem) e a reflectir sobre essas imagens. Enquanto isso, as imagens, combinadas com o que vai acontecendo no mundo exterior e com a memória do passado, vão gerando emoções e sentimentos que geram outras imagens e orientam os seus actos, tanto exteriores como interiores. Estas personagens primitivas são seres perfeitamente conscientes do mundo e de si próprios, dotados de uma história pessoal e individual.

Os hipotéticos neandertais têm contudo alguma dificuldade em manipular ideias complexas - talvez um sinal de que as suas capacidades de memória ainda não desabrocharam totalmente. A tribo mais evoluída, essa, tem muito mais jeito para todos esses exercícios mentais (algo que o autor talvez quisesse sugerir quando abandona o uso da palavra "imagem", mesmo no fim, mal o relato passa a ser do ponto de vista dos "cara de osso").

Os humanos modernos tornaram-se mestres na produção de imagens mentais, na sua análise consciente e na análise, também consciente, dos sentimentos que elas provocam em nós. O nosso cérebro produ-las em contínuo e nem sequer quando dormimos conseguimos interromper o seu fluxo. Somos todos cineastas mentais natos.

As imagens são "a principal moeda da nossa mente", explica António Damásio no seu novo livro, intitulado O Livro da Consciência. E a palavra não se esgota apenas nas imagens visuais, mas aplica-se aos padrões, aos "mapas" neuronais auditivos, viscerais, tácteis e por aí fora, que o cérebro constrói em permanência. Nem os sentimentos fogem à regra: são igualmente imagens. Mais ainda, o nosso cérebro que é "viciado" na criação de mapas, também mapeia o seu próprio funcionamento, gerando imagens totalmente abstractas. "Estou convencido", escreve Damásio, "que os matemáticos e os compositores sobressaem neste tipo de criação de imagens."

Esse filme super-multimédia que vemos na nossa cabeça começa na nossa infância - e de facto, através das relações sociais, da cultura e da aprendizagem, remonta até muito mais longe no passado, quando ainda não tínhamos nascido. Mais ainda, conseguimos antecipar o futuro e agir sobre ele em nosso benefício, individual e colectivo. E mais mais ainda, sentimos que o filme é nosso e só nosso (e de facto, somos o público exclusivo do espectáculo da nossa mente).

Mas como é que lá chegámos? O que aconteceu no nosso cérebro que tornou a consciência possível?

Cérebro, mente, consciência

Como já aconteceu nos seus livros anteriores, as respostas que Damásio se propõe dar a estas perguntas só podem ser válidas se forem firmemente ancoradas na biologia. Afinal de contas, os neurónios que suportam a mente e a consciência são células vivas como as outras; afinal de contas o cérebro, com as suas várias subdivisões e as ligações nervosas entre elas que suportam a mente e a consciência, é a mente e a consciência. Afinal de contas, tudo o que se passa na nossa mente passa-se na nossa cabeça e no nosso corpo (where else?). "De entre as ideias apresentadas neste livro, nenhuma é mais importante do que a noção de que o corpo é o alicerce da mente consciente" escreve Damásio.O Livro da Consciência é a mais recente incursão neste território do célebre neurologista português (radicado nos EUA desde 1975 e figura de primeiro plano não só da comunidade internacional das neurociências, mas também, desde o seu O Erro de Descartes, de 1995, junto do grande público). O título original em inglês do novo livro, Self Comes to Mind, talvez seja mais sugestivo do que o da versão portuguesa, editada pela Temas e Debates/ Círculo de Leitores, que vamos poder ler a partir de hoje (o original só será publicado nos EUA e na Europa em Novembro).

Mas o que importa sublinhar é que o livro define um programa para a futura investigação nesta área. Damásio é o primeiro a admitir que ainda está longe de ter resolvido o mistério do que é a consciência humana (se é que alguma vez o poderá fazer), que está meramente a arranhar a superfície, que nem sequer tem uma teoria, mas apenas um "enquadramento" teórico da questão.

Mas acha que, apesar de haver quem considere a tarefa impossível, ainda é muito cedo para os cientistas desistirem de explicar o que é a consciência em termos rigorosos e testáveis através da experimentação. Tanto mais quanto, nos últimos dez anos, os avanços das técnicas de imagens médicas têm permitido visualizar de forma cada vez mais sofisticada, ao vivo e em directo, o cérebro de pessoas (com e sem lesões neurológicas) a realizar diversas tarefas - para ver qual a região do cérebro que entra em acção a cada instante. Essas manchas de cor nas imagens poderão ser apenas um eco longínquo do filme na nossa cabeça, mas têm muito para nos contar.

A quarta dimensão

Toda essa massa de trabalho científico teve como consequência, para o pensador atento, metódico, profundo que é Damásio, uma mudança radical das premissas do empreendimento. O estudo do aparecimento da consciência humana, explica no livro, já não pode ser encarado da mesma maneira que há dez anos. Tornou-se preciso contar a história da consciência humana de outra maneira - e, por vezes, virada do avesso.

Em primeiro lugar, acrescenta-lhe uma "quarta dimensão": a perspectiva da evolução das espécies. Para conseguir perceber como surge e como funciona a mente humana - e em particular a mente consciente - é preciso abandonar a ideia de que ela é única em todos os seus aspectos. É única nalguns, que não deixam de ser espectaculares (a cultura e as artes estão lá para o provar). Mas a mente nasceu nos organismos vivos muito antes de a espécie humana aparecer na Terra. A consciência não é o apanágio do cérebro humano.

"A evolução brindou-nos com diferentes tipos de cérebro", lemos, "no que diz respeito à mente e à consciência. Temos o tipo de cérebro que produz comportamento mas que parece não ter mente nem consciência, como, por exemplo, o sistema nervoso do Aplysia californica, [um] caracol marinho (...). Existe o tipo de cérebro que produz toda uma vasta gama de fenómenos - comportamento, mente e consciência -, de que o cérebro humano é, claro está, o principal exemplo. Há ainda um terceiro tipo de cérebro que produz claramente comportamento, é provável que dê origem a uma mente, mas em que o grau de consciência é problemático. É o caso dos insectos."

Há mesmo, segundo Damásio, uma série de animais que poderão, ao que tudo indica, possuir uma consciência rudimentar: "os lobos, os nossos primos os símios, os mamíferos marinhos, os elefantes, os felídeos e, claro está, aquela espécie especial chamada cão doméstico".O que lhe permitiu chegar a uma tal conclusão? "A organização dos seus cérebros e a sofisticação dos seus comportamentos sociais", responde-nos, numa troca de e-mail com o Ípsilon. E significa isso que esses animais são conscientes, tal como nós? Que sabem que existem? "Claro que a sua consciência não é tão abrangente como a nossa, mas penso que eles sentem as suas mentes e os seus comportamentos."

Mas então, como imagina o autor a mente de um cão "desde o interior"?, perguntámos ainda. Como "um fluxo muito rico de imagens situadas no presente, com uma leve penumbra de passado e nem a mais mínima ideia de futuro". Mesmo assim, todos sabemos isso, uma mente capaz de amar, de sentir tristeza, medo ou ciúmes... mas não de reflectir sobre a sua condição, não de saber que sabe o que sente.

Seja como for, uma consequência não trivial desta perspectiva evolutiva é que, desde os primórdios da vida na Terra, os cérebros, seja qual for sua sofisticação, sempre estiveram e permanecem dedicados em primeiro lugar à manutenção da integridade dos organismos que os contêm, humanos e não humanos. "A forma mais directa de explicar o motivo pelo qual a consciência prevaleceu na evolução é dizer que contribuiu de modo significativo para a sobrevivência das espécies com ela equipadas. A consciência chegou, viu e venceu", escreve Damásio no seu livro.

Os andares da consciência

Para o demonstrar, o cientista vai, por um lado, desmontar os diferentes sistemas e processos, de complexidade crescente, que culminam na consciência; e, por outro, especular de forma cientificamente informada sobre os locais no cérebro candidatos a ser o "lugar" onde cada um tem a sua sede principal (sem esquecer que o cérebro faz tudo de forma relativamente deslocalizada, o que também não significa que a totalidade do cérebro participe em todas as funções cerebrais; algumas estruturas são mais adequadas do que outras para o desempenho de uma dada função). A cada passo da construção (ou desconstrução), Damásio fornece uma profusão de provas baseadas na observação de doentes com problemas cerebrais muitas vezes trágicos - adultos com Alzheimer, epilepsia, coma, estado vegetativo, síndrome locked-in, crianças que nasceram sem córtex cerebral, a camada exterior do cérebro responsável por todas as funções cognitivas de alto nível a começar pela linguagem, lesões cerebrais maciças ou localizadas - e na de pessoas que não são doentes neurológicos. O seu conhecimento da anatomia do cérebro e a sua capacidade de interpretar sinteticamente os resultados da investigação (a própria e a dos outros), sempre em relação com essa anatomia, constitui um acto de autêntico virtuosismo. O que não significa que o seu livro seja de fácil leitura; antes pelo contrário. Seguir os meandros das explicações encadeadas de Damásio exige a concentração de um jogador de xadrez.

A construção da consciência começa pela formação de um "proto-eu", seguido de um "eu nuclear" e coroado por um "eu autobiográfico". Estes três módulos foram sendo acrescentados um por cima do outro ao longo da evolução e nós humanos possuímos os três, simplesmente porque não podemos prescindir de nenhum deles.

O proto-eu é uma semente, um germe primitivo do eu. A partir das imagens mentais que vêm do corpo, escreve Damásio, o proto-eu produz "sentimentos primordiais" (por exemplo, diversos níveis de dor e de prazer, o "sentir" de base), que são espontâneos e contínuos quando estamos acordados e que "garantem a experiência directa do nosso corpo vivo, sem palavras, sem adornos e sem qualquer outra ligação que não seja a própria existência". Ou seja, um primeiro sinal de que as nossas imagens mentais são nossas, ponto de partida indispensável da consciência.Cérebro arcaico

A principal consequência disto, segundo Damásio, é que a existência da consciência humana é assegurada em parte por sistemas muito "arcaicos" do cérebro, tais como certas estruturas da parte superior do tronco cerebral (o tronco cerebral liga a espinal medula ao cérebro). Isto não fazia até agora parte dos "ingredientes" habituais da consciência. "São muito poucos os cientistas com trabalhos publicados a defender esta ideia", diz-nos Damásio. No livro, escreve: "O cérebro não começa a edificar a mente consciente ao nível do córtex cerebral, mas sim ao nível do tronco cerebral. Os sentimentos primordiais não só são as primeiras imagens geradas pelo cérebro, como também manifestações instantâneas de consciência. São o alicerce que o proto-eu prepara para a construção de níveis mais complexos do eu." E acrescenta: "estas ideias estão em conflito directo com os pontos de vista tradicionais sobre a consciência".

Não é possível esgotar em poucas palavras a complexidade do pensamento de Damásio, mas podemos tentar alinhar os personagens e o enredo da peça da consciência. Além do proto-eu, existem mais dois participantes que completam o elenco da consciência: o eu nuclear (que se desenvolve "numa sequência de imagens que descrevem um objecto a interagir com o proto-eu e a modificá-lo") e o eu autobiográfico (que surge quando todas essas sequências de imagens de múltiplas origens, "cuja totalidade define uma biografia", geram por sua vez "impulsos de eu nuclear" e ligam o eu "ao passado bem como ao futuro antecipado"). O proto-eu, com os seus sentimentos primordiais, e o eu nuclear constituem um "eu material". O eu autobiográfico, que abrange todos os aspectos da pessoa social, constitui um "eu social" e um "eu espiritual".

Mas para realizar o estado de consciência plena - aquele a que só os humanos temos acesso - ainda falta no palco da mente "um dono, um protagonista da existência, um eu que analisa o mundo interior e exterior, um agente que parece a postos para a acção. Falta o narrador que não apenas sabe, mas que sabe que sabe, o "conhecedor" que permite atingir o mais alto patamar da consciência tal como a conhecemos hoje. São o eu nuclear e o eu autobiográfico que vão "dotar-nos a mente [desta] outra variedade de subjectividade", escreve Damásio. "A consciência humana normal corresponde a um processo mental onde operam todos estes níveis do eu".

Dez anos depois

Onde é que as etapas finais da construção da consciência se operam no cérebro? Onde é que se concretiza a subtil e complexa coordenação dos processos que permitem a sua emergência? Devido à sua posição no cérebro e as ligações nervosas que estabelecem com outras regiões, o tálamo, situado entre o tronco e o córtex cerebrais, e uma área do córtex chamada PMC (córtex postero-medial) recolhem o voto favorável de Damásio. Mas isso não significa que exista uma separação de funções: o cérebro não funciona assim. Cada uma dessas três principais "grandes divisões anatómicas" contribui para algum aspecto da "tríade directora" da consciência, formada pelo estado de vigília, a mente e o eu.

Perguntámos a Damásio o que, ao longo desta década, tinha tornado necessária esta sua nova viagem à consciência humana. "Muitas, muitas coisas", diz-nos por e-mail. E especifica que "embora tenha sempre reconhecido o valor das estruturas subcorticais, a perspectiva d'O sentimento de Si era predominantemente centrada no córtex. A d'O Livro da Consciência não é; o subcórtex e o córtex partilham os papéis - e o papel principal vai mesmo para o tronco cerebral." "Embora [no primeiro livro] também tivesse chamado a atenção para o córtex postero-medial, considerei-o como principalmente relacionado com o eu nuclear. Dez anos volvidos, com base em todos os resultados de neuroanatomia e neurofisiologia (...), vejo o seu papel como principalmente ligado ao eu autobiográfico. (...) Fiz ainda alterações teóricas a partir da reavaliação do comportamento das criaturas 'pequenas', das bactérias e por aí fora - e mais geralmente, daquilo que no seu conjunto descrevo como a quarta perspectiva.

E qual a maior novidade no novo livro? "É o que digo sobre o tronco cerebral e sobre a fusão, literalmente, do corpo e do cérebro, que são duas caras da mesma moeda. Este é sem dúvida um dos pontos centrais do livro - e talvez o mais original e o mais sujeito a controvérsia."

Ana Gerschenfeld, Público 27.09.2010

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Uma breve história dos Tipos Psicológicos...


Artigo recolhido no site: http://www.inspiira.org/teoria.php

Em 1927, Carl Jung lança um dos seus livros, “Tipos Psicológicos”, onde ele classifica os seus pacientes, e os seres humanos em geral, de acordo com 3 critérios, que poderiam assumir duas posições opostas, criando oito tipos de personalidade diferentes. Ele não aprofunda muito os seus estudos, pois os seus métodos, apesar de terem conclusões fantásticas, eram talvez um pouco esotéricos demais.


Na década de 50, duas investigadoras, Katherine Briggs Myers e a sua filha Isabel Briggs Myers, que eram directoras duma fábrica nos EUA. Durante a Segunda Guerra Mundial, tiveram que contratar várias mulheres para ocuparem o lugar dos homens que foram para a guerra. Elas começaram a observar grandes diferenças de comportamento entre as suas operárias, e como conheciam o trabalho de Jung, pensaram em desenvolver um indicador que pudesse captar os tipos psicológicos das pessoas, para que se pudesse encaixá-las dentro dos diferentes tipos psicológicos, para entender as suas expectativas, comportamento, entre outras características descritas por Jung.


Estudando um pouco mais da teoria, e aplicando-a na prática, elas identificaram que havia mais um factor em jogo, que alterava toda a estrutura dos outros três. Chegaram assim a 16 tipos, organizados pelos critérios: Extroversão/Introversão, Sensação/Intuição, Pensamento/Sentimento e Julgamento/Percepção. Elas então criaram o indicador e chamaram-no de Myers Briggs Type Indicator, que é como ele é conhecido hoje em dia.


Segue uma explicação breve das dimensões e características dos tipos:


A primeira dimensão do tipo de personalidade diz respeito a como interagimos com o mundo e, principalmente, onde obtemos e onde dirigimos a nossa energia.


Extrovertidos (E)



  • Ganham energia quando interagem com outras pessoas

  • Gostam de concentrar a sua energia no mundo externo das coisas e das pessoas

Introvertidos (I)



  • Ganham energia quando despendem o tempo sozinhos

  • Gostam de concentrar a sua energia no mundo interno das ideias e dos pensamentos

A segunda dimensão do tipo descreve as duas maneiras diferentes como as pessoas percebem, ou assimilam as informações. Que espécie de informação notamos naturalmente? Algumas pessoas concentram-se no que é, enquanto outras no que é possível.

Sensoriais (S)



  • Normalmente prestam mais atenção a factos e detalhes

  • São pessoas mais realistas e práticas

Intuitivos (N)



  • Tentam entender as conexões, significados e implicações

  • São pessoas mais imaginativas e criativas

A terceira dimensão do tipo relaciona-se com a maneira como tomamos decisões e chegamos às conclusões. Todos nós apresentamos uma preferência natural inata para tomar decisões baseadas na lógica ou nos nossos sentimentos e valores pessoais.


Pensadores (T)



  • Tomam as decisões mais objectivamente, pesando os prós e contras

  • Valorizam a lógica e a justiça; um mesmo padrão para todos

Sentimentais (F)



  • Tomam as decisões baseados em como se sentem acerca de cada assunto e como os outros serão afectados

  • Valorizam a empatia e a harmonia; vêem a excepção para a regra

A quarta dimensão do tipo de personalidade relaciona-se com o facto de se preferimos viver de uma maneira mais organizada (tomando decisões) ou de uma maneira mais espontânea (assimilando informações).

Julgadores (J)



  • São mais felizes depois das decisões terem sido tomadas

  • Tendem a tomar as decisões rápida e facilmente

Perceptivos (P)



  • São mais felizes deixando as suas opções abertas

  • Tendem a sentirem-se ansiosos e inseguros ao tomarem decisões

Existem mais características observáveis em cada um dos critérios, mas acho que estas podem dar uma boa ideia do que cada critério mede. Então, conjugando essas quatro dualidades, obtêm-se 16 diferentes tipos psicológicos, que podem ser agrupados como subgrupos usando diferentes critérios, com diferentes aplicações.


Na década de 70, David Keirsey, psicólogo americano, lançou um livro com um nome não muito pretensioso, pelo menos para os académicos: “Please Understand Me”. Neste livro, ele criou um desses subgrupos que citei acima, que ele veio chamar de Temperamentos.


O modelo utilizado para os 4 temperamentos (contendo 4 tipos cada um), já havia sido usado no campo da Filosofia, desde Galeno, e os gregos antigos, alguns até bastante conhecidos, como Platão e Aristóteles.


Este modelo do Keirsey uniu a teoria proposta por Jung, o critério extra desenvolvido pela família Myers Briggs e também a ideia delas do indicador, mais a teoria dos Temperamentos que foi designado por diferentes nomes na história da Psicologia, e definiu os quatro Temperamentos, que são definidos pela presença de duas letras específicas no tipo das pessoas:



  • SP: Sensorial Perceptivo (chamados Artesãos) – Tipos: ISFP, ESFP, ISTP, ESTP

SPs desejam estar onde está a acção; eles procuram aventura e anseiam por prazer e estimulação. Marvin Zuckerman, um psicólogo americano, definiu esse tipo como "a personalidade que busca sensação". Os SPs acreditam que a variedade é o tempero da vida, e que fazer coisas que não são divertidas ou excitantes é uma perda de tempo.



  • SJ: Sensorial Julgador (chamados Guardiões) – Tipos: ISFJ, ESFJ, ISTJ, ESTJ

SJs são pessoas sensatas, realistas e que são a espinha dorsal das instituições e os verdadeiros estabilizadores da sociedade. Eles acreditam em seguir as regras e cooperar com as autoridades; de facto, eles não se sentem nada bem em improvisar ou causar problemas ou conflitos.



  • NF: Intuitivo Sentimental (chamados Idealistas) – Tipos: INFP, ENFP, INFJ, ENFJ

Os NFs acreditam que a cooperação amigável é a melhor forma para que as pessoas atinjam os seus objetivos. Eles sonham em remover os muros de egoísmo e dos conflitos que dividem as pessoas e têm um talento único para ajudar as pessoas a resolver as suas diferenças e assim trabalharem juntas. Tal harmonia interpessoal poderia ser um ideal romântico, mas os NFs são românticos incuráveis que preferem concentrarem-se no que poderia ser em vez do que no que é.



  • NT: Intuitivo Pensador (chamados Racionais) – Tipos: INTJ, ENTJ, INTP, ENTP

Seja qual for o seu campo, os NTs esforçam-se por compreender o mundo natural em toda a sua complexidade. NTs desejam aprender acerca dos princípios abstratos ou leis naturais que descrevem a realidade, como também em descobrir a estrutura e função dos sistemas complexos do mundo; sejam sistemas mecânicos, orgânicos ou sociais. Eles são completamente pragmáticos acerca de como ganharão esse conhecimento.


Em resumo, os artesãos seriam as pessoas que curtem o momento, e querem viver todas as oportunidades, e aceitam o que lhes for dado. Os guardiões são os pilares da sociedade, e as pessoas que querem manter tudo como está a ser feito, os tradicionalistas (os conservadores). Os idealistas são aquelas pessoas que vivem no mundo das ideias, sem se preocuparem muito de que maneira vão executar qualquer plano de acção. E os racionais são preocupados com conceitos, ideias e teorias, e estão preocupados de que maneira podem usar os seus conhecimentos para terem um impacto positivo na vida das pessoas. Grandes cientistas da história pertencem a este último grupo.


Leia também seu relatório vocacional:

INFJ
INTJ
ISFP
ESFJ

ENFJ
ENTP
ESTP
ESTJ

INFP
INTP
ISTP
ISTJ

ENFP
ENTJ
ESFPISFJ

Conheça também os relatórios dos 16 Tipos:


INFJ
INTJ
ISFP
ESFJ

ENFJ
ENTP
ESTP
ESTJ

INFP
INTP
ISTP
ISTJ

ENFP
ENTJ
ESFP

ISFJ

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quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Kieron Williamson - um pequeno génio da pintura


Tem apenas oito anos, mas já vendeu quadros a coleccionadores dos quatro cantos do mundo. O seu talento está a deixar boquiabertos os críticos de arte

Dizem que o seu traço é parecido com o do mestre francês do impressionismo. No mês passado, expôs 33 quadros em Norfolk, o condado britânico onde nasceu. Vendeu todos em menos de meia hora por 182 mil euros. Tem oitos anos, chama-se Kieron Williamson, mas todos os britânicos o conhecem como "mini- -Monet".

No Verão de 2008 foi de férias com os pais à Cornualha e gostou de ver os barcos atracados no porto. Pediu à mãe que o ajudasse a desenhá-los. O que tinham os barcos de especial? "Acho que a maneira como estavam posicionados", respondeu a um jornalista do Daily Telegraph.

Passou o resto das férias a desenhar, mas não se contentou com os barcos. Casas e paisagens foram o passo seguinte. A partir daí, Kieron começou a passar uma hora por semana no estúdio de uma pintora de Holt, a cidade onde vive, evoluindo rapidamente. Uma das primeiras coisas que Carol Pennington lhe pediu foi que misturasse diferentes tons de cinzento. Quando terminou, o pequeno aprendiz tinha conseguido 25 tons diferentes. Sabia exactamente como os tinha feito e como queria usá-los.

No Verão do ano seguinte, começou a fazer workshops que lhe permitiram desenvolver o domínio das técnicas de pintura. Foi nessa altura que expôs pela primeira vez os seus trabalhos e acabou por vender 19 quadros por um total de 14 mil libras (17 mil euros). Passados poucos meses, em Novembro, expôs 16 obras que deveriam estar em exposição durante um mês, mas acabaram por ser vendidas por 17 mil libras (21 mil euros) em apenas 15 minutos.

A fama do pequeno pintor começou a correr mundo e criou uma enorme curiosidade em torno dos seus quadros, levando coleccionadores dos quatro cantos do mundo a acampar à porta da sua última exposição até que esta abrisse. As cores que misturou estão por esta altura espalhadas por países como Holan-da, Alemanha, Canadá, Grécia, Japão, Estados Unidos, Taiwan, França e até Portugal.

Concentrado, mas enérgico. Reservado e ao mesmo tempo curioso, o pequeno inglês tem uma irmã de cinco anos, é adepto do Leeds United e diz que é o melhor defesa da equipa da escola.

Perante rumores de que o seu filho possa sofrer de autismo, Michelle e Keith esclarecem no site oficial de Kieron que o seu desenvolvimento foi "completamente normal". "É uma criança muito concentrada e determinada". "Não é autista - basta mudar uma letra - é artista", disse Michelle, uma nutricionista de 36 anos, ao Daily Telegraph. Já o pai, começou a trabalhar como negociante de arte pouco depois de Kieron ter começado a pintar, levando muitos a perguntarem-se se tudo não se tratará de um esquema. Os pais garantem que o reconhecimento do talento de Kieron só foi possível com o apoio das galerias de arte da cidade e que se limitaram a dar os materiais ao filho sem o forçar a nada.

O pequeno grande artista diz que prefere pintar a óleo. "Mas os pastéis também são bons para conseguir céus mais dramáticos."

|Catarina Reis Fonseca, DN

Alguns exemplos:






















quarta-feira, 26 de maio de 2010

O homem mais feliz do mundo?





























Matthieu Ricard trocou a engenharia molecular pelo budismo. É um dos monges mais próximos de Dalai Lama e está em Lisboa para falar sobre os efeitos da meditação.
A ciência diz que este deve ser o homem mais feliz do mundo
Vinte minutos de meditação por dia são suficientes para melhorar a sua vida. Quem o diz não é o novo guru da auto-ajuda que acaba de chegar às estantes da bomba de gasolina, mas o braço-direito de Dalai Lama, o monge Matthieu Ricard. O francês de 64 anos foi até considerado o homem mais feliz do mundo, apesar de ficar embaraçado com o apelido. "Como podem dizer que sou o mais feliz do mundo se não analisaram todas as pessoas?", questiona a rir Matthieu Ricard.
O i devolve a explicação. O monge participou numa investigação da Universidade de Wisconsin, nos Estados Unidos, sobre os efeitos a curto e médio prazo da meditação nas funções cerebrais e deixou os cientistas de boca a aberta. Pode dizer-se que literalmente rebentou a escala da felicidade. "Quando fui convidado a participar no estudo, pensava que o efeito da meditação não se iria notar. Mas foi impressionante, os cientistas ficaram muito entusiasmados."

O cérebro do monge foi monitorizado, o que significou colar 256 sensores na cabeça durante três horas. A escala de felicidade, criada para a investigação (testada em centenas de pessoas) ia de um mínimo de felicidade, +0.3, ao máximo: -0.3. Matthieu Ricard atingiu -0.45.

Desde 2000 que Matthieu Ricard tem convencido outros monges experientes - com mais de 10 mil horas de meditação - a juntarem-se às investigações de neurociência e tem feito várias conferências para divulgar estas descobertas.

Acabado de chegar de mais um estudo nos Estados Unidos, Matthieu Ricard está pela quinta vez em Portugal. Amanhã dará uma conferência na Aula Magna, em Lisboa, sobre "neurociência e felicidade". "Quero mostrar uma nova maneira de ver o cérebro. Não há dúvidas de que devemos ir à escola para estudar ou de que quando temos um hobby, seja tocar piano ou fazer jogging, temos de treinar, o mesmo se passa com o cérebro. Temos de o trabalhar para sermos mais felizes. A felicidade é complexa e tem de vir de dentro de nós e não ficar dependente do exterior, senão vivemos numa montanha-russa."

Meditar
Para exemplificar melhor, o monge apressa-se a apresentar mais um estudo - talvez, seja um tique de ex-cientista. Aqui vai. Dividiram 30 pessoas, sem experiência em meditação, em dois grupos. Ao primeiro grupo pediram que, durante oito semanas, meditassem 20 minutos por dia. O outro ficou com a tarefa mais fácil: continuar a vida normal sem meditar. No final, o grupo que meditou tinha níveis de felicidade mais elevados e menos ansiedade. Até a pressão arterial estava mais baixa. "A meditação deve ser levada a sério. Se fazemos tudo para ter um corpo saudável, também devemos investir na mente. Arranja-se sempre tempo para a meditação", diz.

Outro conselho do monge é: "ser altruísta compensa". Aquela coisa da sociedade ocidental - cada um por si - afinal não resulta assim tão bem. "Um grupo de investigadores norte-americanos deu 15 dólares a dois grupos de jovens para gastarem durante uns dias. O primeiro só podia comprar coisas para si. O segundo teve de gastar o dinheiro com os outros, dar comida a pessoas que precisavam ou a levar alguém a passear. O primeiro grupo ficou aborrecido, enquanto o segundo registou níveis de felicidade muito mais elevados", diz o monge.

"Quero ser assim"
Matthieu Ricard nasceu no meio de intelectuais. Tomava café com prémios Nobel, jantou com Cartier-Bresson e almoçou com Stravinsky. Filho do filósofo Jean-François Revel e doutorado em Genética Molecular pelo Instituto Pasteur, Matthieu estava traçado para uma carreira académica de sucesso. Mas tudo mudou em 1967. "Vi um bonito documentário com os grandes mestres do Tibete e pensei: 'Quero ser assim.'" Em 1972 trocou de vez a França pelos Himalaias. Conheceu Dalai Lama através do seu professor Kangyur Rinpoche e há mais de 20 anos que é o tradutor e braço-direito de sua santidade.

Matthieu Ricard é também fotógrafo e autor de diversos livros sobre meditação, incluindo o bestseller "The Monk and the Philosopher" - um diálogo com o seu pai. Pelo meio arranja sempre tempo para os 14 projectos de solidariedade social


Conferência “Neurociência e Felicidade”

Dia 26, às 21horas
Aula Magna, Alameda da Universidade, Lisboa
Preços: €10 a €15

Vanda Marques, Jornal I

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Ciência estuda cérebro para perceber consumo


Porque é que investimos, poupamos ou gastamos o nosso dinheiro? As respostas podem ser "lidas" nos nossos cérebros.

As decisões económicas são imprevisíveis porque nem sempre são racionais, mas a neuroeconomia pode ajudar a compreender melhor o que está na base de determinados comportamentos e tendências, estudando a forma como o cérebro funciona.

Esta ciência está ainda a dar os primeiros passos, mas pode vir a tornar-se uma ferramenta muito útil, defende o investigador e autor do livro "Neuroeconomia - Ensaio sobre a sociobiologia do comportamento", de José Eduardo Carvalho.
Os estudos neuroeconómicos revelam o papel das emoções nas escolhas estratégicas e podem contribuir para ajustar os modelos económicos a uma nova realidade. Recorrendo a áreas científicas como a cromotografia, a microelectrónica e a nanotecnologia, os neurocientistas dispõem de "um conjunto de instrumentos que permite ver em tempo real como é que as pessoas reagem, em termos hormonais, se forem estimuladas".

"O que as pessoas dizem nem sempre corresponde à realidade", sublinha o professor universitário. "Hoje, é possível ver isso e estes instrumentos podem optimizar a informação de que os economistas hoje dispõem."

No entanto, a nova ciência está a ser mais aproveitada pelos "homens do marketing" do que pelos economistas. A neurociência descobriu que há zonas do cérebro que são estimuladas quando uma pessoa é confrontada com um dado objecto, mas nem sempre funcionam de forma racional. "A estimulação é visível numa determinada zona e depois há outra zona que faz a aferição do preço, por exemplo, mas se houver uma deficiência do funcionamento cerebral, essa zona não se 'acende' e o indivíduo pode endividar-se para comprar um bem de que não necessita."

A explicação para o sobre-endividamento pode ter também a ver com outra descoberta: "Temos uma componente genética que nos pode fazer desenvolver uma certa propensão para o consumo, mas também há uma componente cultural, que resulta de uma aprendizagem e que se transmite através de gerações", explicou o economista.

Os comportamentos económicos reflectem crenças e valores, salienta. Ao contrário do que acontecia há décadas, em que os pobres se resignavam e não ambicionavam chegar a uma classe superior, hoje as pessoas com menores rendimentos "são constantemente estimuladas para o consumo, pelos anúncios e pelas telenovelas e vão interiorizando estes padrões", avança José Eduardo Carvalho.
|Raquel Rito, DN

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Pablo voltou a andar com hormonas de crescimento

Contra todas as previsões dos clínicos, um jovem espanhol recuperou a 100% de um acidente de automóvel. Foi o próprio pai, médico e investigador, quem decidiu aplicar-lhe um método pioneiro que utiliza hormonas de crescimento na regeneração de lesões. Os médicos portugueses dividem-se sobre este novo tratamento: para uns é uma esperança para doenças neurológicas; para outros levanta ainda muitas dúvidas éticas e de segurança.

Uma clínica espanhola, em Santiago de Compostela, promete resultados surpreendentes na cura de doenças cerebrais e de deficiências motoras, com a aplicação de hormonas de crescimento. Os benefícios destas substâncias produzidas naturalmente na hipófise (glândula situada na base do cérebro) são reconhecidos por exemplo para aumentar a altura em pessoas com problemas de crescimento (ver texto ao lado). Mas, na regeneração dos neurónios, este programa é pioneiro.

Com este tratamento, o director do Centro de Reabilitação Foltra, Jesús Devesa, professor catedrático na Universidade de Santiago de Compostela, conseguiu recuperar o filho, que ficou com lesões cerebrais depois de um grave acidente de carro. Foi o seu primeiro doente. E Pablo, hoje com 29 anos, conseguiu voltar a andar, falar e comer. Depois dele, o tratamento foi usado noutros 300 doentes paraplégicos ou com deficiência mental congénita ou adquirida. "Injectamos hormonas de crescimento na área subcutânea do braço, que induzem a produção de células- -mãe e regeneram os tecidos danificados", descreve Jesús Devesa ao DN, assegurando uma taxa de sucesso na casa dos 90%. Entretanto, a descoberta veio a público em Espanha e a técnica vai ser aplicada também num centro de paraplégicos de Toledo.

As hormonas de crescimento seriam uma solução para os 150 mil portugueses com deficiência motora ou os 75 mil que sofrem de lesões cerebrais? Ou ainda os 200 novos casos de crianças com paralisia cerebral que nascem por ano em Portugal? Os médicos dividem-se. Embora não conheçam bem o tratamento, uns acreditam que pode ser uma esperança nos casos de paraplegias. Para outros é uma "aplicação meramente experimental e episódica", sem explicações científicas fundamentadas e com implicações no plano ético e da segurança.

Pablo Devesa tinha saído de casa para se encontrar com os amigos, quando um acidente de viação o lançou num coma profundo durante um mês. "Lembro--me estar a chover muito e de eu ter embatido numa casa", conta o biólogo ao DN. Depois, ficou tudo escuro e imóvel.

O acidente atirou--o para uma cama nos cuidados intensivos, com um traumatismo cranioencefálico e uma hemiplegia - uma paralisia das funções de um lado do corpo. "O traumatismo comprometeu o lado esquerdo do meu cérebro. Quando acordei, os médicos não me davam muitas esperanças de recuperação. Não conseguia falar, comer ou andar", lembra Pablo.

Já em casa, o pai, Jesús Devesa, não hesitou em aplicar no filho os ensinamentos que desenvolvera durante anos em laboratório. "Estava consciente do que fazia. Sabia que era eficaz e tinha de acreditar nisso", sublinha o médico.

Durante os meses seguintes, Pablo recebeu diariamente uma dose de hormonas de crescimento (produzidas industrialmente a partir de engenharia genética), em ciclos de 15 dias. "O seu efeito chega às zonas onde está a lesão, levando à proliferação de células-mãe e restituindo os estímulos nervosos no local afectado", diz Pablo. O tratamento era articulado com um plano intensivo de fisioterapia.

"Cada caso é um caso e a dose a aplicar depende da doença, da idade e do progresso do paciente", indica Jesús Devesa, acrescentando: "Nas crianças, o processo de recuperação é mais rápido, pois a neuroplasticidade promove uma proliferação mais célere das células".

Pablo tinha 22 anos, e a sua recuperação fez-se em oito meses. "Fiquei curado, sem sequelas. A recuperação foi a 100%. Hoje levo uma vida completamente normal, como qualquer jovem. Jogo futebol, bebo um copo com amigos."

Mais: está há um ano a trabalhar no Centro de Neurociências e Biologia Celular da Universidade de Coimbra, como investigador, e a terminar a tese de doutoramento a defender dentro de semanas. A base da investigação? O seu próprio caso e as implicações das hormonas de crescimento no processo de neuroregeneração. "É um trabalho que segue as linhas de orientação da investigação do meu pai. Quero comprovar os resultados em humanos, sem efeitos secundários, no sentido de dar uma base científica mais aprofundada", diz Pablo Devesa.

O tratamento não é consensual nos especialistas portugueses. José Luís Medina, director do Serviço de Endocrinologia do Hospital de São João, mostra-se optimista: "Cientificamente devemos esperar pelos resultados do estudo, mas é uma esperança." "Devido às suas propriedades de crescimento e proliferação celular, talvez se possam obter alguns efeitos em situações como esta", diz Manuela Carvalheiro, presidente da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo.

Já Fernando Baptista, do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, é mais céptico. "Será uma aplicação meramente experimental e pode ser geradora de falsas expectativas", alerta. "Nos últimos anos têm sido demonstrados outros efeitos a nível metabólico, mas não é o caso dos efeitos eventualmente neuroregeneradores deste caso."

O presidente da Sociedade Portuguesa de Neurociências, João Malva, coordenador da equipa onde trabalha Pablo Devesa, no centro de neurociências, mostra-se bastante crítico. "É um tratamento que tem implicações sérias no plano ético e da segurança, uma vez que a hormona do crescimento pode trazer problemas secundários muito significativos associados à proliferação descontrolada de células, como em tumores", avisa o biólogo. "Acreditar na sua eficácia é uma questão de fé, porque do ponto de vista científico não há explicações fundamentadas. Mas a motivação dos pacientes pode fazer milagres", conclui.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Teoria Ecológica do Desenvolvimento Humano- Bronfenbrenner



http://www.ricardosaldanha.com.br/wp-content/uploads/2008/04/teoria-dos-sistemas-ecologicos-krebs.pdf




Roteiro de trabalho:


1. Faça o levantamento dos conceitos-chave da teoria ecológica do desenvolvimento e elabore um mapa conceptual que mostre a articulação entre esses conceitos.
2. A teoria ecológica pode ser aplicada no desporto? Responda a esta questão tendo em conta as problemáticas relacionadas com a formação desportiva e o seu contributo para o desenvolvimento equilibrado das crianças (e das pessoas, em geral).
3. O desenvolvimento das crianças portadoras de deficiência pode ser explicado pela teoria ecológica. Escolha um tipo de deficiência e faça uma pesquisa sobre as crianças que são portadoras dessa deficiência. Depois, sistematize os dados recolhidos, com base na teoria ecológica do desenvolvimento.

Jogos de tabuleiro desenvolvem raciocínio dos mais jovens de forma divertida






















Cerca de duas dezenas de crianças e jovens, do ensino primário ao secundário, juntaram-se esta tarde numa sessão de jogos matemáticos, que têm como objectivo desenvolver o raciocínio.

Avaliar, ponderar, antecipar, delinear uma estratégia, testar a jogada, corrigir se for preciso, e jogar para derrotar o adversário. Foi em torno deste processo, patente em jogos de tabuleiro de cariz matemático, que esta tarde um grupo de jovens ocupou o seu tempo e atenção.

Distribuídos por idades, as crianças e jovens de diversas idades que esta tarde responderam ao apelo do pólo do Instituto Superior Técnico do Taguspark, em Oeiras - que em parceria com a Associação Ludus, esta tarde organizou um "Festival de Jogos Matemáticos" -, confirmaram que a matemática não só é útil, como pode ser divertida.

"São jogos bem escolhidos no sentido em que são jogos intelectuais sem factor sorte, são jogos de estratégia que puxam o raciocínio, essencialmente do género matemático", explicou Jorge Nuno Silva, professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e presidente da Associação Ludus. "São jogos de tabuleiro, com regras muito simples, mas com estratégias em aberto", referiu Jorge Nuno Silva que acrescentou que estes jogos se assemelham ao xadrez no sentido em que não é possível aprender a jogá-los na perfeição.

Estes jogos estão particularmente indicados para os mais jovens, até porque, referiu o presidente da Associação Ludus, "está documentado que a prática deste tipo de jogos de tabuleiro está associada a um melhor desempenho escolar", e que apesar de terem operações simples, ajudam a desenvolver o raciocínio lógico.

"As operações são de tipo abstracto, são do género que faz um jogador de xadrez. Tem de pensar, antecipar, testar, optar, corrigir, esse tipo de processo intelectual que está intimamente ligado ao processo da resolução de problemas matemáticos. O processo interno mental é muito semelhante", disse.

Inês Filipar, de 11 anos, e Francisco Fernandes, de 10 anos, foram agrupados no mesmo nível de dificuldade - jogos de 2º nível, para alunos do 2º ciclo - e defrontaram-se numa partida de Konane, um jogo havaiano em que o jogador movimenta as peças de forma a "comer" as peças do adversário.

"Isto é divertido. Também tem coisas matemáticas, mas não é muito difícil, não é preciso pensar muito", disse Inês, que encarou a derrota na partida com sentido de humor. "Ele até ganhou, mas é sorte de principiante como eu lhe disse", brincou a jovem participante.

Francisco, o oponente, que aprendeu a jogar Konane apenas hoje, é um adepto da matemática que consegue ver vantagens neste tipo de jogos. "Acho que ajuda a desenvolver o raciocínio matemático. Ajuda-me a pensar bem", disse.
|Público

Efeitos da consanguinidade na famíla de Darwin



Darwin: selecção pouco natural amaldiçoa a família


Dos dez filhos de Emma e Darwin, três tiveram morte prematura e outros três foram inférteis

Charles Darwin, autor da teoria da evolução das espécies que revolucionou a ciência, parece ter condenado a própria descendência devido aos problemas de consanguinidade da sua família. Os cientistas relacionam uma série de casamentos entre primos na família de Charles Darwin e na de Emma Wedgwood, com quem se casou, com os níveis anormais de infertilidade e morte prematura tanto entre os seus familiares como nos seus próprios descendentes. Dos seus dez filhos, três tiveram morte prematura, enquanto outros três foram inférteis.

O estudo dos antepassados de Darwin revela uma história de casamentos consanguíneos nos Darwins e nos Wedgwoods que poderão ter produzido uma série de defeitos genéticos - a maior parte das mutações genéticas não se manifestam quando são herdadas apenas de um dos pais. Na era vitoriana era bastante comum primos direitos casarem entre si mas nestas famílias esta tendência foi ainda mais acentuada, de acordo com James Moore, professor de História da Ciência da Universidade Aberta do Reino Unido, que se prepara para publicar o estudo. "Os resultados são incríveis: 26 crianças nasceram de casamentos entre primos em primeiro grau, 19 das quais não conseguiram ter filhos", diz Moore. As conclusões baseiam-se no trabalho de investigação de Michael Golubovsky, professor de Biologia Molecular da Universidade da Califórnia, Berkeley, EUA, que publicou um estudo sobre a infertilidade de três dos filhos de Darwin. Golubovsky acredita que uma mutação genética herdada dos dois progenitores provocou a infertilidade.
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André Patrocínio, Jornal I online

domingo, 14 de março de 2010

Quando a mãe falta


Luís Francisco ficou viúvo um dia depois de ter sido pai de Carolina, em Outubro de 2006. A sua mulher, Susana Amorim, sofreu de síndroma de Hellp após o parto e acabou por falecer na sequência de um AVC. No primeiro ano, Luís diz que "andava a pairar". Não se recorda de quase nada. Tem flashes apenas. Uma das imagens mais fortes que lhe vem à memória é a da filha com dias de vida, ao seu colo, à procura do peito materno. "Tinha de acordá-la a meio da noite para lhe dar o biberão e via a cabeça dela de um lado para o outro à procura da mama... Nessas alturas, sei que não conseguia segurar as lágrimas."

Como se aquela dor não bastasse e a responsabilidade de ser pai sozinho não fosse suficiente, o destino pregou-lhe nova partida. Três meses depois de perder Susana, Luís viu a outra mulher da sua vida partir. Também assim, de repente, sem mais. "No dia 25 de Dezembro, a minha mãe sentiu-se mal, foi para o hospital, e a 7 de Janeiro faleceu. Apareceu-lhe um cancro, que era desconhecido até aí, e teve uma embolia. Então fiquei mesmo sozinho. Já tinha perdido o meu pai há uns anos. Valeu-me a minha irmã, que se desdobrou em baixas médicas e férias para me ajudar, o resto da família e os amigos, que foram incansáveis. Andaram comigo ao colo... Acho que ainda hoje andam!"

Luís tem 35 anos, Carolina 3. Vivem ambos para os lados da Venda do Pinheiro, onde já têm uma rotina instalada. De manhã, Luís leva a filha ao infantário, a poucos quilómetros de casa, e segue para o trabalho de produtor gráfico numa empresa das redondezas. Vai buscá-la às seis e meia, dá-lhe banho, prepara o jantar - "tenho sempre sopa feita por mim ou por alguém da família" -, e depois vem o período preferido de ambos, o da brincadeira. "A Carolina gosta de brincar com bebés, Legos, faz desenhos e pinturas", explica. Às 21 é hora de ir para a cama. "Se for mesmo às nove ainda há história, se já for mais tarde não há história", conta.

Sentimento de revolta

Quem o ouve pode pensar que conseguiu superar tudo com desembaraço, mas na realidade não lhe é fácil falar do que aconteceu, embora nunca saia da pose de bonacheirão bem-disposto. Confessa que, quando recebeu a notícia da morte da mulher, se sentiu "vazio". "Parece que não estamos nem neste mundo nem no outro. Não andamos, deslizamos", descreve. Seguiu-se "uma revolta muito grande e uma sensação de injustiça". Afinal, Carolina foi uma filha desejada e programada depois de quase 15 anos de vida a dois. Susana foi a primeira e única namorada. Conheceram-se tinha ele 17 anos. Na gravidez, tudo correu "normalmente", desde as consultas médicas até ao parto na Maternidade Alfredo da Costa (MAC). Luís assistiu ao nascimento da filha, que foi "relativamente rápido", segundo ele, demorando "talvez meia hora, 45 minutos". Nada fazia prever aquele desfecho algumas horas depois.

A síndroma de Hellp é rara e pode levar a insuficiência cardíaca e pulmonar, hemorragia interna, acidente vascular cerebral (AVC) e outras complicações graves na mãe. Tanto pode ocorrer durante a gravidez como, no caso de Susana, após o parto. Os sintomas incluem fadiga, mal-estar generalizado, vómitos, dor de cabeça, retenção de líquidos e algumas vezes convulsões, mas a doença não é fácil de diagnosticar.

Luís considera que houve negligência, uma vez que "ela queixou-se de dores de cabeça e mal-estar a seguir ao parto" e, na sua opinião, "não lhe deram a devida atenção". O caso chegou à comunicação social, porque Susana esteve quase uma hora à espera de ser transferida da MAC para São José já depois de sofrer convulsões e o AVC. Tudo porque o INEM e a MAC não se entendiam sobre quem devia fazer o transporte da doente. "Não sei se aquele tempo de espera foi fatal ou se quando teve o AVC já a hemorragia a tinha afectado muito. Cheguei a meter o caso em tribunal, mas foi arquivado. Dizem que nestes casos não há nada a fazer. Nem quero mexer mais nisso", desabafa, para concluir: "A Susana não merecia aquela sorte."

Durante um ano, o jovem pai ficou em casa da mãe, em Odivelas. Gozou cinco meses de licença de maternidade, começou a trabalhar e só depois regressou ao apartamento onde vivia com a mulher. Não mudou praticamente nada, nem escondeu as fotos de Susana. Carolina sabe e diz que "a mãe Susana está no céu".

Pai a tempo inteiro

Nos primeiros tempos, encarar a vida sem a mulher e a mãe foi "bem mais difícil do que cuidar da Carolina". Confessa que pensou no suicídio "mais do que uma vez", mas a filha e o apoio dos que o rodeavam foram mais fortes. A irmã, Ana Cristina (41 anos), incutiu-lhe desde o início que os bebés "não se partem, precisam de apanhar sol, frio, etc., e têm de se adaptar ao mundo cá fora". Talvez por isso, ou por instinto, nunca sentiu grandes dificuldades em mudar as fraldas, dar banho ou vestir a filha. "Agora, sim, é mais difícil, porque ela já foge", conta a rir, confessando que neste patamar o mais complicado é "conjugar roupas". "A cena dos penteados e do ganchinho... Sou homem, para essas coisas não tenho mesmo jeito!"

E se dar-lhe banho, alimentá-la ou vesti-la nunca foi problema, já educá-la "sem o outro lado" começa a revelar-se uma tarefa hercúlea. É que, neste caso, a mesma pessoa que ralha é a que vai passar a mão a seguir. "Quando o meu pai me punha de castigo, a minha mãe vinha ter comigo e explicava-me porque é que estava de castigo. Eu tenho de fazer os dois papéis. E gerir essa situação às vezes é complicado", até porque, segundo diz, a filha tem uma "personalidade forte" e um "mas eu quero" sempre na ponta da língua. "E eu não aguento ouvi-la chorar mais do que dez minutos."

As preocupações de pai e de homem não se ficam por aqui. Luís tem noção de que "há coisas" de que não vai conseguir falar com a Carolina "como uma mulher, uma mãe". Como, por exemplo, sobre "coisas íntimas, dos namoros", diz a rir, concluindo: "Por força das circunstâncias, nem eu voltei a ser o mesmo nem a Carolina será educada nas circunstâncias normais, entre aspas." No entanto, diz que tem sorte, porque a filha não é uma criança difícil, "come bem, até quando faz birra". É doce e cheia de energia, embora revele "um feitio impetuoso e independente", que acaba por caracterizar assim: "É uma Susana em ponto pequeno."

Vida própria

Após a morte de Susana, Luís passou a olhar para "todas as mulheres" como se fossem "potenciais mães da Carolina", confessa numa gargalhada. Com o total apoio da família, retomou a sua vida pessoal e social. Fê-lo até como "autoterapia", arranjando tempo para sair com amigos, aos fins-de-semana. "Felizmente, tenho muita gente próxima que não se importa de ficar com a Carolina quando preciso." Há um ano, começou a namorar com Lurdes, com quem pensa vir a ter filhos. E, apesar de a filha ter aceite "muito bem" a namorada do pai, Lurdes só passou a viver com Luís e Carolina na segunda-feira passada.

Luís diz que sente que tem uma relação "diferente e especial" com a filha e explica que passou a encarar a morte de outra forma, como algo que "pode acontecer a qualquer momento". Mas, se "a vontade de viver é agora maior", o medo de morrer também o é. "Acho que ainda hoje estou para apanhar com a chapada da morte da Susana e da minha mãe. Tenho um medo constante de me ir abaixo", confessa.

Publicado na Revista Única de 6 de Março de 2010

"Sem a biologia, não há tratamento das doenças mentais"

Entrevista a Tom Insel, director dos National Institutes of Mental Health dos EUA

Para se conseguir um dia diagnosticar a tempo e tratar eficazmente as doenças mentais vai ser preciso encará-las não como doenças puramente comportamentais, mas como doenças cerebrais, abrindo assim a psiquiatria às neurociências e à genética. Tom Insel dirige, desde 2002, a maior agência de financiamento público da investigação em saúde mental do mundo: os National Institutes of Mental Health (NIMH) dos EUA, com um orçamento anual de 1500 milhões de dólares. Psiquiatra de formação, Insel já foi investigador - estudou a neurobiologia e a genética de comportamentos complexos, como o amor e os laços sociais -, mas agora diz que o seu papel consiste em "falar sobre maneiras radicalmente diferentes de pensar a doença mental" para fomentar a "inovação disruptiva" nesta área.
Há duas semanas esteve em Lisboa, onde deu uma conferência na Fundação Gulbenkian, integrada no Fórum Gulbenkian da Saúde, este ano dedicado à doença mental. A seguir, respondeu às perguntas do PÚBLICO.

O que é a doença mental?
É uma boa pergunta - uma pergunta justa, porque se me perguntassem o que é o cancro ou as doenças cardíacas, eu saberia explicar. Para mim, a doença mental é uma perturbação cerebral. Mas, ao contrário do que acontece com outras perturbações cerebrais, aqui não existe uma lesão detectável. É mais uma lesão funcional, devida ao facto de certos circuitos cerebrais não estarem devidamente sincronizados ou não funcionarem bem.

Por que é que a doença mental é vista como sendo tão diferente das doenças físicas?
Exactamente por isso: porque nunca fomos capazes de encontrar provas dessa disfunção cerebral. Quando uma pessoa sofre de "doença mental" - digamos que está deprimida - e se descobre que ela tem um cancro do pâncreas (o que, em 50 por cento dos casos, está associado a uma depressão grave), diz-se que essa pessoa não tem uma depressão; tem um cancro do pâncreas. Da mesma forma, quando alguém sofre de autismo e se descobre que tem uma síndrome do X frágil [doença genética do desenvolvimento cerebral], afirma-se logo que se trata de um caso de X frágil e não de autismo.
Ou seja, mal se identifica uma causa física, a doença sai do domínio da psiquiatria e passa a fazer parte da medicina "a sério". Mas o que eu digo é que, de facto, as pessoas com depressão que não sofrem de cancro do pâncreas têm contudo qualquer coisa, na maneira como os seus cérebros funcionam, que é anormal. Tão anormal como um cancro do pâncreas em relação a um pâncreas normal.

Disse na sua conferência que, nas doenças neurológicas como o Parkinson ou o Alzheimer, há morte celular, ao passo que as doenças mentais são doenças dos circuitos celulares.
Exactamente. A única excepção a essa regra é a epilepsia. A epilepsia não revela células mortas e é claramente um problema ao nível dos circuitos. Tem graça, aliás, que em certos países a epilepsia seja considerada uma doença psiquiátrica e noutros uma doença neurológica. O que eu digo é que tanto umas como outras são perturbações cerebrais.
Temos de criar uma nova disciplina. Esqueçam a neurologia, esqueçam a psiquiatria, essas disciplinas pertencem ao século XX. No século XXI, precisamos de uma coisa chamada neurociência clínica, capaz de juntar a psiquiatria e a neurologia.
Foi assim que tudo começou: antes de 1900 e talvez até aos anos 1950, a psiquiatria e a neurologia eram uma única disciplina. Freud era neurologista. Está na altura de as tornar a reunir. São como um casal que teve um bom casamento e que depois se divorciou por causa das crianças. Agora, as crianças já estão crescidas e está na altura de os pais se reconciliarem.

Acha que um dia vamos perceber as doenças mentais como hoje percebemos as do corpo?
Acho. Mas vai ser mais difícil, porque estas doenças são mais complexas do que o cancro, do que a diabetes ou as doenças cardíacas. O cérebro é um órgão muito mais complexo do que qualquer outro.
Lembro-me da altura em que ninguém percebia muito bem o que era o cancro. Mas de há dez anos para cá, deixámos de olhar para o cancro da mama, por exemplo, como uma única doença. São dez doenças, com dez tratamentos diferentes.
Temos de fazer o mesmo caminho com doenças como a esquizofrenia, a depressão, o stress pós-traumático. Existem provavelmente formas diferentes de depressão que exigem tratamentos completamente diferentes, porque os mecanismos em jogo são diferentes.
Não é possível continuar a pressupor que o diagnóstico clínico fornece toda a informação necessária sobre a doença mental. Para distinguir os diferentes tipos de cancros e os tratamentos adequados, foi preciso escavar até ao nível da biologia, da genética, da expressão dos genes. Os resultados são melhores quando o fazemos do que quando não o fazemos. O mesmo vai ter de acontecer com a depressão. Vamos ter de perceber o indivíduo não só ao nível comportamental, mas também biológico.

Mas a doença mental está intimamente ligada à personalidade e à história do doente, não apenas à sua biologia.
Pois. Por isso, temos de nos perguntar como é possível que as mesmas circunstâncias traumáticas possam destruir a esperança de alguns e formar o carácter de outros. Temos de ver se é possível identificar variações genéticas que confiram vulnerabilidade ou resistência à doença mental e mesmo se é possível desenvolver uma ciência quantitativa da exposição aos traumas psicossociais, tal como se fez para as toxinas ambientais.
Ainda não temos respostas. Mas é por isso que estamos tão interessados na genética - e não apenas na genética do risco, mas na genética da resiliência. Uma das coisas mais interessantes do momento é que podemos, pela primeira vez, ver as pequenas "pegadas" que a exposição [a factores externos] deixa no ADN. Acho que esta nova área da "epigenética" (ou "epigenómica") vai mudar as regras do jogo.

Para diagnosticar as doenças físicas, existem marcadores biológicos - o nível de certas proteínas, diversas técnicas de imagem. Quais vão ser os marcadores das doenças mentais?
As técnicas de imagem pareciam muito prometedoras, mas o problema é que os sinais [da actividade cerebral] são diminutos e a variabilidade muito grande. Contudo, há estudos que indicam que elas talvez sirvam para prever como um dado doente irá reagir à medicação.
A proteómica - a análise de certas proteínas do sangue - também parecia interessante, mas ainda não deu resultados concretos, embora os esforços nesta área em relação à esquizofrenia sejam impressionantes. Por outro lado, há também muita investigação do autismo ao nível do genoma. E na área da encefalografia, há resultados que indicam que a encefalografia magnética poderá ser um marcador biológico para o stress pós-traumático.
Acho que, dentro de uns anos, vamos pensar não em termos de biomarcadores, mas em termos de "bioassinaturas" que combinarão todas estas ferramentas. É exactamente isso que já se faz hoje no caso das isquémias cardíacas: combina-se a imagiologia cardíaca, a medição dos níveis de colesterol, os estudos genéticos e a electrocardiografia. Juntando a isso a história familiar e a situação clínica, obtém-se um quadro que permite avaliar o risco de cada pessoa perante a doença isquémica e definir o tratamento. É isso que temos de fazer com a doença mental.

O NIMH quer redefinir as doenças mentais. O objectivo é esquecer completamente a classificação actual das doenças mentais segundo o Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM) para construir outra, totalmente nova?
Sim, estamos muito interessados nisto. Mas não seria como refazer o DSM. A classificação do DSM [a "bíblia" das doenças mentais, editada pela Associação Americana de Psiquiatria e actualmente em revisão] não é suficientemente diferenciadora. Transposto para a cardiologia, por exemplo, o nível actual do DSM levaria a colocar todas as doenças cardíacas sob a designação de "dor no peito"...
Mas ainda não estamos prontos para operar esta mudança. Por enquanto, como agência de financiamento, o NIMH está a criar as condições para se começar a pensar que, a menos que levemos em conta a biologia das doenças mentais, não vamos conseguir tratá-las. Tencionamos investir o nosso dinheiro para incentivar as pessoas a pensar desta nova maneira, para que esqueçam as etiquetas do tipo depressão, stress pós-traumático, autismo.
O autismo, aliás, é o nosso maior problema, porque engloba umas 40 doenças diferentes. Na minha opinião, a nossa visão actual do autismo corresponde ao que era há décadas a nossa ideia da febre. Hoje, quando uma criança é etiquetada como autista, há quem ache que a doença foi causada por uma vacina e há quem pense que foi a incapacidade dos pais em tratar da criança. É exactamente o mesmo tipo de discussão que acontecia em torno de uma criança com febre quando não havia maneira de saber se a causa era uma infecção bacteriana, viral - ou o nascimento dos primeiros dentes.

Mas existe uma grande resistência por parte da comunidade médica.
Os psiquiatras não têm a formação necessária para pensar de outra maneira. Mas a boa notícia é que vem aí uma nova geração, muito diferente da actual. Hoje, cerca de metade dos estudantes de medicina [nos EUA] têm uma especialização em neurociências. Quando começam a exercer, já sabem tudo sobre o cérebro. Vai ser preciso ceder-lhes o lugar. A nossa esperança está no grupo dos menos de 30 anos.

Esta mudança pode assinalar o fim da psiquiatria, das psicoterapias, da psicanálise?
A psicanálise já era, essa é fácil. A questão é saber se serão os psiquiatras a fazer psicoterapias. O grande valor das psicoterapias é indubitável, apesar de tudo o que acabei de dizer sobre os aspectos biológicos. Se uma pessoa parte uma perna, não nos limitamos a dar-lhe uns analgésicos e a dizer que volte dentro de um ano. Ela tem de fazer reabilitação, nós temos de garantir que vai reaprender a andar. E para alguém que teve um episódio psicótico ou uma depressão grave, é igualmente essencial fornecer esse tipo de apoio. A medicação é apenas uma parcela do trabalho de recuperação - e, em muitos casos, nem sequer é a mais importante. Não me passaria pela cabeça negar a importância da reabilitação e das intervenções psicossociais.

Há muitas pessoas que, sem estarem clinicamente doentes, se sentem deprimidas e tristes. Vai também ser possível aliviar mais eficazmente esse sofrimento?
O objectivo da psiquiatria não é tornar toda a gente feliz. Não estamos aqui para erradicar a infelicidade humana, porque ela faz parte da vida. A tristeza faz parte da vida, a desilusão, a infelicidade, a ansiedade, tudo isto faz parte do funcionamento humano normal, adaptativo. E a psiquiatria é como qualquer outra área da medicina: lidamos com doenças, com situações em que a infelicidade deixa de ser normal e se torna um ciclo vicioso do qual não é possível sair sozinho.
Todos temos dores no peito, todos perdemos por vezes o fôlego - se corrermos muito, isso pode perfeitamente acontecer. Mas nem os cardiologistas nem os pneumologistas consideram que a sua meta seja garantir que ninguém perde o fôlego. O que fazem é identificar quando é que um sintoma como este passa a fazer parte de uma doença real, que exige tratamento.
Vai ser muito importante para as áreas da psiquiatria e da saúde mental em geral distinguir a doença que exige apoio clínico das instâncias normais da experiência humana. Acho que de nada serve considerar como patológico este tipo de vivência. Faz parte da condição humana.

Disse na sua conferência que a psiquiatria trata a doença mental nos últimos estádios, porque ela só se manifesta clinicamente quando já é tarde de mais. Porquê, então, uma tal resistência em mudar as práticas médicas e psiquiátricas?
Para sermos totalmente justos, a verdade é que ainda não temos maneira de detectar a doença mental mais precocemente. Estamos quase a chegar lá no que respeita à esquizofrenia. Também tem havido imensa investigação em relação ao autismo. Normalmente, o autismo é diagnosticado aos dois anos de idade, mas nós gostaríamos de conseguir fazê-lo às duas semanas de vida, só que ainda não sabemos como. É o nosso objectivo científico, não é ainda uma realidade. O modelo a seguir é o da medicina cardiovascular e estamos longe da meta. Mas se o que realmente queremos é conseguir diagnosticar a doença mental mais cedo, temos de desenvolver a ciência já.

Já foi acusado de querer reduzir tudo à biologia?
Já, mas não recentemente. Acontecia-me muito mais quando era cientista em vez de administrador e estudava comportamentos extremamente complexos ao nível molecular. Diziam-me que estava a reduzir o amor a único gene – uma crítica legítima. Achavam isso nojento.
Mas a realidade mostrou que nessa área, quanto mais “moleculares” nos tornávamos, mais espectaculares eram as implicações dos nossos resultados. Era uma abordagem reducionista na medida em que estudávamos mudanças extremamente quantificáveis e discretas no genoma, mas esse trabalho levantava questões muito profundas acerca da nossa evolução, da nossa organização social, da maneira como o cérebro cria significado social. E isso era tudo menos reducionista.
A noção de que quanto mais biológica for a abordagem, menos holística e mais reducionista será, está muitas vezes errada. Na minha experiência, quanto mais mecanicistas nos tornamos, maior a profundidade das questões. Este tipo de abordagem ajuda-nos a questionar os nossos pressupostos e a reconhecer que a maneira como a evolução deu origem ao cérebro não tem nada a ver com o que imaginávamos.
Um exemplo: quando olhamos para os genes e os circuitos cerebrais, percebemos imediatamente que as categorias diagnósticas que utilizamos actualmente para as doenças mentais não podem estar certas, porque não têm nada a ver com a forma como a natureza construiu o cérebro. O facto de nos concentrarmos mais na biologia vai permitir uma forma muito mais holística – e, penso eu, muito mais válida – de pensar nos comportamentos e na organização social humana.
|Ana Gerschenfeld, Público

Freud e a Psicanálise

Freud e a Psicanálise de Paulo Gomes